Frutas e legumes sem sanitização e carne mal passada podem transmitir doenças graves

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"O peixe morre pela boca", diz um famoso ditado popular. Essa frase, no entanto, também pode ser usada para os seres humanos. Segundo estimativa da Organização Mundial da Saúde (OMS), mais de 350 mil pessoas em todo o mundo morreram em decorrência da ingestão de comida contaminada em 2010.

Entre os alimentos que mais causam doenças estão frutas e legumes. Quando consumidos crus e mal higienizados, eles podem transmitir bactérias, como as Salmonellas, Shigellas e Escherichia coli (E. coli) , que provocam diarreias em diferentes intensidades. O morango, por exemplo, tem-se destacado como um dos transmissores dos vírus das hepatites A e E, que causam inflamação no fígado. Mais recentemente surtos de salmonelas foram ligados a sementes de chia e queijo feito com castanhas-de-caju (queijo vegano). Uma grande epidemia de E. coli com muitos casos de falência renal foi reportada também recentemente na Alemanha e relacionada a uma plantação de comida natural de brotos de feijão. Cerca de 3 mil casos ocorreram, com mais de 30 óbitos.

A listeria é outro tipo de bactéria que, embora não seja muito observada no Brasil, fez recentemente várias vítimas nos Estados Unidos através do consumo de melão e maçãs caramelizadas. Os queijos frescos ou cremosos também podem transmitir a listeria. Essa doença, geralmente, não provoca diarreia, mas pode causar meningite e até septicemia - infecção generalizada grave que se espalha por todo o corpo.

Segundo a infectologista do Hospital Sírio-Libanês, dra. Maria Beatriz Gandra de Souza Dias, essas bactérias e vírus contaminam os alimentos pela falta de higiene adequada durante o cultivo, a produção e a venda do produto. "Vários produtores, por exemplo, utilizam água de reuso na irrigação de pomares e hortas", comenta a médica.

No caso da listeria, por exemplo, o Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC) informa que os melões envolvidos em surtos provavelmente foram contaminados nas plantações onde foram cultivados ou durante o processo de embalagem do produto, e os queijos não foram pasteurizados adequadamente.

Sendo assim, as frutas e os legumes devem ser sempre bem lavados com água corrente e sanitizados com solução clorada. Ou seja, submersos por 15 a 20 minutos em uma solução com água e cloro ativo a 200 ppm. O Ministério da Saúde indica uma colher (sopa) de hipoclorito de sódio (água sanitária própria para alimentos) para cada um litro de água. Produtos específicos para essa finalidade também podem ser comprados prontos em supermercados (geralmente ficam próximos à área de venda dos vegetais) e são distribuídos gratuitamente em postos de saúde.

Os queijos devem ser consumidos somente após pasteurização, privilegiando sempre os industrializados de boa procedência (veja abaixo outras dicas preventivas).

Carne, frango, peixe e frutos do mar

Se o segredo para evitar o consumo de frutas e legumes contaminados está na higienização, a dica para consumir carnes e outros produtos de origem animal está no cozimento.

A carne de vaca mal passada, por exemplo, pode transmitir a toxoplasmose. Essa doença apresenta sintomas como febre, gânglios e dores de cabeça, podendo causar problemas no miocárdio, no fígado, nos músculos e nos olhos. Surtos de infecção intestinal por E. coli relacionados ao consumo de hambúrguer também foram reportados recentemente nos Estados Unidos.

A carne de porco é uma das transmissoras da Taenia solium, um verme muito comprido. Essa parasitose se manifesta com enjoos, diarreia ou dor abdominal, mas pode ficar assintomática por muitos anos. Pedaços da tênia que refluam para o estômago podem liberar ovos cujas larvas penetram o trato digestivo e vão se alojar no cérebro, causando a neurocisticercose. Um cisticerco localizado no cérebro, por exemplo, pode causar dores de cabeça, convulsões, confusão mental e até morte.

A carne de carneiro mal passada pode transmitir a hidatidose, que causa doença cística no fígado.

Já os ovos, frangos e perus mais frequentemente estão contaminados com veículos de Salmonellas. Por isso é essencial que sejam cozidos antes de servidos. As maioneses, mousses e outras receitas que levam ovo cru são responsáveis por surtos de diarreia em grande escala, muitas vezes envolvendo comemorações festivas e causando seu fiasco.

Peixes podem estar contaminados pelo Diphyllobothrium latum, um verme que pode causar desconforto abdominal, náusea, vômito e diarreias; e frutos do mar, especialmente os que vivem em conchas, se coletados junto à costa de áreas habitadas, podem transmitir doenças bacterianas graves como a cólera, outros víbrios (tipo de bactéria) e hepatites.

"Independentemente de qual for o animal, carnes e ovos crus ou mal passados trazem riscos à saúde", ressalta a dra. Maria Beatriz. "As gestantes, principalmente, devem evitar qualquer alimento cru, pois a contaminação da mãe e, consequentemente, do feto, pode acarretar malformações com consequências graves para o futuro da criança", completa a infectologista.

Sushi, quibe cru e bife tártaro, embora bem apetitosos, têm mais chance de contaminação que os alimentos cozidos. Deve-se evitar a ingestão desses alimentos em locais desconhecidos.

Toxinas

Há registros também de contaminação por botulismo em alimentos em conserva, particularmente os enlatados como palmito, aspargos, feijões verdes, milho e cogumelos.

Os sintomas do botulismo são neurológicos e não no trato digestivo. Podem se manifestar por meio de tonturas, visão embaçada e boca seca. Pode haver também o comprometimento progressivo do sistema nervoso e até paralisia dos músculos respiratórios, que pode ser fatal.

Alimentos em conserva que estiverem em latas estufadas, vidros embaçados, embalagens danificadas ou com alterações no cheiro e no aspecto não devem ser consumidos.

As toxinas pré-formadas de Staphylococcus aureus e Bacillus cereus também podem estar contidas em diversos tipos de alimentos, como leite e seus derivados, alimentos à base de trigo e sobremesas à base de creme, causando sintomas digestivos como náusea, vômitos e diarreia durante minutos ou horas após sua ingestão.

Doenças pouco frequentes

Em 2014, o estado do Amapá registrou vários casos de doença de Chagas relacionada à ingestão de açaí contaminado. Essa doença é transmitida pela picada do inseto "barbeiro", mas pode ser transmitida também pela alimentação. O inseto teria sido moído junto com a semente do açaí, o que já foi observado no Brasil com a cana-de-açúcar, na moagem para preparo da garapa.

A doença de Chagas tem como sintomas: febre, mal-estar, dor nos gânglios e aumento de fígado e baço. Meningite e encefalite são complicações mais graves da doença. Se houver cronificação, pode ocorrer megacólon, megaesôfago e coração dilatado, tipos de flagelos antigos da população brasileira.

O famoso "leite no pé da vaca", celebrado nas comunidades rurais, pode transmitir a brucelose, que se caracteriza por doença febril prolongada, que pode ser acompanhada de inchaço nos gânglios e outras manifestações.

Previna-se das doenças transmitidas por alimentos

  • Higienize as mãos e limpe as superfícies da cozinha, utensílios e tábuas de cortar com frequência.
  • Separe os alimentos prontos dos crus para não haver contaminação cruzada, até mesmo na geladeira.
  • Alimentos crus devem ser mantidos na prateleira inferior da geladeira, alimentos semiprontos, nas prateleiras intermediárias e alimentos prontos, nas prateleiras superiores.
  • Cozinhe todos os alimentos a uma temperatura igual ou superior a 74oC.
  • Mantenha na geladeira ou no freezer os alimentos que precisarem de refrigeração.
  • Atenção ao estado de conservação das embalagens e com a validade dos alimentos.
  • Durante as compras, os alimentos perecíveis devem ser os últimos colocados no carrinho. Se o tempo para guardá-los na geladeira for grande, recomenda-se o uso de sacolas térmicas.

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