- Home › Blog › Psiquiatria › A relação entre sono, neurodesenvolvimento e saúde mental
A relação entre sono, neurodesenvolvimento e saúde mental
O sono é um pilar essencial para o desenvolvimento cerebral e emocional na infância e adolescência. Este artigo aborda como a qualidade do sono impacta a memória, a cognição, a regulação emocional e até a prevenção de transtornos mentais.
Dr. Vinicius Barbosa
04/09/2025 · 5 min de leitura
O sono como pilar do desenvolvimento cerebral e emocional
O sono exerce papel fundamental no desenvolvimento neuropsicológico e na saúde mental ao longo da infância e adolescência, sendo considerado um dos pilares essenciais para o crescimento saudável e essencial para a maturação cerebral. A literatura recente reforça que a qualidade e a quantidade adequadas de sono são determinantes para processos de consolidação da memória, regulação emocional, plasticidade sináptica e desenvolvimento de reservas cognitivas, além de atuarem como fatores protetores contra transtornos psiquiátricos e dificuldades comportamentais [1–5].
Mudanças fisiológicas e influência do ambiente
Durante o desenvolvimento infantil, o sono apresenta características dinâmicas, com mudanças fisiológicas e comportamentais que acompanham as diferentes fases da maturação cerebral. Trata-se de um processo altamente sensível ao ambiente, às condições clínicas e às interações parentais. Crianças pequenas, por exemplo, dependem fortemente de co-regulação para estabelecer padrões de sono saudáveis, o que demonstra a importância da qualidade do vínculo e das rotinas familiares. A privação ou fragmentação do sono em períodos críticos do neurodesenvolvimento pode desencadear alterações neurobiológicas persistentes, afetando circuitos relacionados à cognição, ao comportamento e à regulação emocional [2–3].
Consequências da privação de sono precoce
Estudos em modelos animais demonstram que a restrição de sono precoce compromete a neurogênese, a maturação sináptica e a plasticidade neural, resultando em déficits de memória, aprendizado e maior vulnerabilidade a distúrbios psiquiátricos na vida adulta [3–4]. Também se observam respostas inflamatórias exacerbadas e alterações do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, contribuindo para um estado de estresse tóxico, especialmente deletério, durante as janelas críticas do desenvolvimento cerebral.
Relação bidirecional entre sono e saúde mental
A relação entre sono e saúde mental é bidirecional: distúrbios do sono podem ser tanto preditores quanto consequências de quadros psiquiátricos, como ansiedade, depressão e transtornos do neurodesenvolvimento [2,5]. Crianças e adolescentes com padrões de sono inadequados apresentam maior risco de sintomas internalizantes (ansiedade, depressão) e externalizantes (agressividade, impulsividade), além de prejuízos acadêmicos e sociais [1–2]. Em adolescentes, há ainda a questão da desregulação cronobiológica, especialmente pela tendência ao atraso de fase do ciclo sono-vigília, que contribui para menor duração do sono nos dias úteis e aumento da sonolência diurna, impactando diretamente a performance escolar e o equilíbrio emocional [1,5].
Fatores ambientais, culturais e de gênero
Fatores ambientais e comportamentais, como exposição a telas, uso de dispositivos eletrônicos, horários irregulares de sono e pressão acadêmica, têm impacto significativo sobre a arquitetura e a eficiência do sono em crianças e adolescentes [1]. A influência cultural também é relevante, modulando hábitos de sono, duração e percepção de sua importância, com variações entre diferentes contextos socioculturais.
Além disso, a literatura aponta que diferenças de gênero tornam-se mais evidentes após a puberdade, com meninas apresentando maior prevalência de distúrbios do sono, sintomas depressivos e queixas subjetivas relacionadas ao cansaço e à dificuldade de adormecer, possivelmente mediadas por fatores hormonais e psicossociais [1].
Sono e transtornos do neurodesenvolvimento
No contexto dos transtornos do neurodesenvolvimento, como o transtorno do espectro autista e o TDAH, distúrbios do sono são altamente prevalentes e frequentemente exacerbam sintomas comportamentais e cognitivos [1]. Crianças autistas, por exemplo, podem apresentar alterações no ritmo circadiano, com padrões atípicos de secreção de melatonina e menor eficiência no sono REM, afetando negativamente o processo de consolidação da linguagem e da função executiva. A abordagem multidimensional do sono, considerando fatores biológicos, comportamentais e ambientais, é fundamental para o manejo desses pacientes, com intervenções que visam tanto a higiene do sono quanto a modulação de fatores externos, incluindo o uso criterioso de fitoterápicos e intervenções farmacológicas, quando indicadas [1,5].
Sono como construtor de reserva cognitiva
Do ponto de vista fisiológico, o sono adequado contribui para a construção de uma reserva cognitiva e neuronal, conceito que se refere à capacidade do cérebro de resistir a insultos e declínios funcionais ao longo da vida [4]. A literatura experimental demonstra que a privação de sono compromete mecanismos de plasticidade sináptica, neurogênese e integridade estrutural cerebral, enquanto o sono de boa qualidade favorece a consolidação de memórias e o desenvolvimento de estratégias adaptativas frente a desafios cognitivos [3–4].
A promoção da saúde do sono emerge, portanto, como estratégia central para a prevenção de transtornos mentais e para o suporte ao desenvolvimento saudável. Intervenções baseadas em ciência comportamental, educação em sono e implementação de rotinas regulares têm mostrado eficácia na melhora da qualidade do sono e, consequentemente, na redução de sintomas psiquiátricos [5]. A atuação precoce em contextos clínicos e educacionais, com foco em políticas públicas de regulação do tempo escolar e campanhas de sensibilização sobre a higiene do sono, representa um passo relevante na construção de sociedades mais saudáveis e resilientes.
Cuidar da mente é essencial para viver com equilíbrio. Conte com os especialistas do Sírio-Libanês para sua saúde mental.
As condições psiquiátricas merecem acolhimento, escuta qualificada e uma abordagem personalizada para garantir bem-estar e qualidade de vida.
No Núcleo de Psiquiatria do Hospital Sírio-Libanês, você encontra uma equipe multidisciplinar preparada para atuar com seriedade, empatia e compromisso, unindo conhecimento técnico, ciência atualizada e cuidado integral.
Se você enfrenta sintomas como ansiedade, insônia, alterações de humor ou deseja investir em saúde emocional de forma preventiva, agende uma consulta com nossos especialistas.
Referências:
Meneo D, Gavriloff D, Cerolini S, et al. A Closer Look at Paediatric Sleep: Sleep Health and Sleep Behavioural Disorders in Children and Adolescents. Journal of Sleep Research. 2025;:e70078. doi:10.1111/jsr.70078.
Alrousan G, Hassan A, Pillai AA, Atrooz F, Salim S. Early Life Sleep Deprivation and Brain Development: Insights From Human and Animal Studies. Frontiers in Neuroscience. 2022;16:833786. doi:10.3389/fnins.2022.833786.
Dalferth TF, Nunes ML, Furini CRG. Sleep Deprivation in Early Life: Cellular and Behavioral Impacts. Neuroscience and Biobehavioral Reviews. 2024;159:105597. doi:10.1016/j.neubiorev.2024.105597.
Balsamo F, Meneo D, Berretta E, Baglioni C, Gelfo F. Could Sleep Be a Brain/Cognitive/Neural Reserve-Builder Factor? Neuroscience and Biobehavioral Reviews. 2025;169:106015. doi:10.1016/j.neubiorev.2025.106015.
Harvey AG. Treating Sleep and Circadian Problems to Promote Mental Health: Perspectives on Comorbidity, Implementation Science and Behavior Change. Sleep. 2022;45(4):zsac026. doi:10.1093/sleep/zsac026.