O ministro interino da Saúde, o general da ativa Eduardo Pazuello, afirmou a parlamentares na terça-feira (23) que o governo federal prepara uma estratégia de testagem em massa dos brasileiros. O Brasil é um dos países mais afetados pela pandemia do novo coronavírus que menos aplicou, proporcionalmente, testes em sua população. Identificar os doentes por meio de exames e quebrar a cadeia de transmissão do vírus, isolando doentes por ao menos 14 dias e rastreando seus contatos, é uma das mais importantes medidas de controle da doença. É também um dos critérios da OMS (Organização Mundial de Saúde) para que os países possam reabrir com segurança. A pandemia foi decretada oficialmente em 11 de março de 2020. Na segunda-feira (22), o diretor-executivo da OMS, Michael Ryan, disse que a proporção de resultados positivos dos testes aplicados no Brasil aponta para uma baixa testagem no país e para um número subestimado de doentes. Ao todo, 31% dos exames aplicados dão resultados positivos no Brasil. “Nos países que aplicam grande número de testes, a porcentagem de positivos fica perto de 5%”, afirmou. Uma pesquisa do Imperial College, de Londres, estimou que o Brasil registrou oficialmente apenas 34% de todos os casos possíveis de infecção da doença. O número real de contaminados pode, portanto, ser o triplo do que as estatísticas dos governos estaduais mostram. A intenção do Ministério da Saúde, divulgada por Pazuello, é aplicar os exames em 50 milhões de pessoas, o equivalente a cerca de 24% da população. Na quarta-feira (24), porém, o Ministério da Saúde falou em 46 milhões de testes, número que já havia sido anunciado pelo ex-ministro Nelson Teich. Metade dos testes será do tipo rápido, que identifica a presença de anticorpos contra o coronavírus no organismo, e a outra metade, de testes PCR, que mostram se a pessoa está infectada pelo Sars-CoV-2 no momento do exame. A pasta vem tendo dificuldades em entregar os testes prometidos e em comprar mais unidades. Na quarta-feira (24), o órgão anunciou que buscará adquirir novos tipos de exames, mais precisos. A meta para realizar toda a testagem, que era até dezembro, foi eliminada. A ideia é não ter mais um prazo para terminar a campanha. 11,3 milhões de testes foram distribuídos pelo Ministério da Saúde aos estados até a terça-feira (23), de um total de 46,2 milhões prometidos O Brasil é o segundo país do mundo em número de casos e de mortes pela covid-19, atrás apenas dos Estados Unidos. Entre os dez países mais afetados, o Brasil é o segundo que menos testa, atrás apenas da Índia. Segundo dados do site Worldometers, o Brasil já realizou 12.603 testes por 1 milhão de habitantes, número quase dez vezes menor do que países como o Reino Unido (125.844 testes por 1 milhão de habitantes) e a Rússia (122.001 pela mesma proporção da população). Pazuello também defendeu a inclusão de diagnósticos clínicos na base de dados para que os governos tenham uma visão mais realista da evolução da doença no país. Esse tipo de diagnóstico é dado pelo médico com base no histórico do paciente de exposição ao vírus, sintomas da doença e exames como radiografias e tomografias. Os testes que identificam o coronavírus não seriam feitos, mas o paciente poderia, mesmo assim, ser diagnosticado com a doença. Há cerca de 200 tipos de testes para a detecção do coronavírus registrados pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). Eles se dividem entre dois tipos: os que usam sangue, soro ou plasma e os analisam amostras de secreções do nariz e da garganta. Explicado Pandemia: origens e impactos, da peste bubônica à covid-19 Índex Tudo sobre Coronavírus no Nexo Gráfico Qual o material mais eficaz para máscaras, segundo este estudo Os tipos de testes Sangue, soro ou plasma Os chamados testes sorológicos mostram a partir de uma amostra de sangue se a pessoa já teve no passado contato com o vírus. Eles detectam a presença de anticorpos produzidos pelo próprio organismo em resposta à infecção. São dois tipos de anticorpos: o IgM, que é uma resposta inicial, e o IgG, que gradualmente vai substituindo o primeiro. Ele é o anticorpo que, em tese, cria imunidade. Como essa proteção natural do organismo leva cerca de 15 dias para se formar, os testes sorológicos são indicados a partir do décimo dia após o início dos sintomas. Na rede privada, esses testes custam de R$ 90 a R$ 380. Secreções das vias respiratórias os testes PCR ou RT-PCR, também chamados de moleculares, diagnosticam a presença do vírus no organismo a partir de amostras de secreções do nariz ou da garganta coletadas por uma espécie de cotonete gigante (swab). São considerados o padrão-ouro, por serem mais precisos. A sigla, em inglês, significa transcrição reversa seguida de reação em cadeia da polimerase. Na amostra, a fita simples de RNA do vírus é detectada e transformada por enzimas numa dupla fita de DNA. Esse DNA é amplificado bilhões de vezes numa máquina com ciclos de mudança de temperatura, o que facilita a identificação do material genético do vírus por emissão de luz para a confirmação do caso. É realizado do terceiro ao décimo dia a partir do aparecimento dos sintomas. Gratuito na rede público, pode ser feito a pedido médico em hospitais particulares por um valor que varia de R$ 150 a R$ 470. Os problemas dos testes Apesar de os testes PCR serem mais confiáveis, há obstáculos para seu uso em larga escala. Eles precisam de laboratórios equipados e com alto poder de processamento, além de profissionais capacitados. Por isso, são caros e mais demorados no diagnóstico, o que pode levar até dois dias para acontecer. As amostras ainda precisam ser acondicionadas em refrigeradores a -20ºC ou em freezers a -70ºC. Hospitais do SUS (Sistema Único de Saúde) têm recorrido a laboratórios privados contratados pelas prefeituras para processar os testes PCR, a um preço que varia de R$ 150 a R$ 203 por exame. Reportagem publicada pelo jornal Folha de S.Paulo na quarta-feira (24) mostrou que a rede estadual criada para realizar exames da covid-19 está ociosa. Segundo as secretarias de saúde, a situação se deve a contratos fechados no início da pandemia para desafogar a fila de exames represados. 500 amostras por dia de testes PCR são, em média, processadas em grandes laboratórios públicos do país, segundo o Ministério da Saúde 860.604 testes PCR foram realizados na rede pública até 23 de junho, de acordo com o órgão; somando com a rede privada, país aplicou 1,48 milhão de exames do tipo Já os testes sorológicos, que usam amostras de sangue, podem em muitos casos dar o diagnóstico num prazo de 10 a 30 minutos — por isso são chamados de testes rápidos. Eles têm como vantagem serem mais baratos, mas seu uso em massa é questionado por poderem apresentar, a depender da marca, 15% de erro em resultados negativos e de 1% a 5% em resultados positivos. As alternativas Como alternativa aos testes usados pelos governos, hospitais e laboratórios criaram novos tipos de exames. O Hospital Sírio-Libanês lançou em parceria com o laboratório brasileiro Mendelics, em junho, um tipo de teste molecular que usa a saliva do paciente e demora apenas uma hora para dar o resultado. Seu custo é de R$ 95. O Hospital Israelita Albert Einstein patenteou em maio um teste que coleta secreções por meio de um swab, mas que permite um processamento das amostras numa velocidade 16 vezes maior do que o PCR. Seu custo divulgado inicialmente é de R$ 250, mas o hospital analisava o valor. No final de maio, o laboratório Fleury também desenvolveu um teste que usa a técnica de espectrometria de massa, que identifica proteínas do Sars-CoV-2 por meio da medida de massa e estrutura. O método também usa coleta de secreção do nariz ou garganta, mas as amostras não precisam ser mantidas em temperaturas negativas. O diagnóstico pode sair em três horas, segundo o laboratório, a um custo de R$ 180. O que se sabe sobre o vírus? O QUE É A COVID-19? A covid-19 é uma doença infecciosa da família de vírus chamada de coronavírus. Essa nova doença tem origem ainda incerta, mas o mais provável é que o vírus tenha vindo de animais vendidos no mercado central de Wuhan, metrópole chinesa onde o vírus foi descoberto, em dezembro de 2019. QUAIS SÃO OS SINTOMAS? Além dos sintomas típicos da gripe – como febre, tosse, dor muscular e cansaço –, o coronavírus pode afetar o sistema respiratório da vítima, causando pneumonia e podendo matar. As pessoas mais suscetíveis às consequências graves do vírus são idosos e pessoas com condições preexistentes. COMO É A TRANSMISSÃO? O coronavírus é transmitido da mesma forma que uma gripe comum. Isso significa que a doença é transmitida pelo contato com secreções de pessoas contaminadas: gotículas de saliva, espirro, tosse, toque ou aperto de mão seguido de contato com boca, nariz e olhos. COMO É POSSÍVEL SE PREVENIR? Para reduzir os riscos de contágio e de transmissão, o Ministério da Saúde recomenda medidas como evitar contato próximo com doentes, cobrir nariz e boca quando espirrar ou tossir, evitar tocar mucosas de olhos, nariz e boca e manter os ambientes bem ventilados. Lavar frequente e adequadamente as mãos é uma das principais recomendações, uma vez que expor o vírus ao sabão o destrói com eficácia. Devido ao avanço da pandemia, governos e especialistas têm recomendado (e, em alguns países, imposto) a adoção do distanciamento social, um esforço coletivo em reduzir o contato entre as pessoas para conter a transmissão dos vírus. Aglomerações e reuniões em lugares fechados devem ser evitadas. EXISTE TRATAMENTO? Até 18 de março de 2020, não existia um tratamento específico para o vírus, nem vacina preventiva. A recomendação é que as pessoas infectadas fiquem isoladas e permaneçam em observação. Elas devem ficar em repouso e se hidratar. Além disso, é recomendável se medicar com analgésicos para aliviar os sintomas. QUAL A LETALIDADE DO VÍRUS? A letalidade da covid-19 está estimada em torno de 3% e 4%. Essa estimativa é baseada apenas em casos confirmados da doença, ainda que somente uma pequena parte da população seja submetida a testes para detectar o vírus, e que haja uma fração dos infectados que não apresentam sintomas e, por isso, tendem a não buscar a testagem. A taxa estimada para a covid-19 representa um nível menor de letalidade do que a de outras doenças, como, por exemplo, a Sars (síndrome respiratória aguda grave, que se alastrou entre os anos 2002 e 2004). No entanto, causa grande preocupação a rapidez da transmissão do novo tipo de coronavírus e a alta letalidade dele em pessoas do chamado “grupo de risco”, acima dos 60 anos e/ou com condições respiratórias, cardiovasculares ou imunológicas pré-existentes. O Nexo também tem um Índex com todos os conteúdos produzidos pelo jornal sobre a pandemia. 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